Modernizando a TI para um papel estratégico

Rogério Marques

19 julho 2017 - 18:15 | Atualizado em 29 março 2023 - 17:42

Pessoa utilizando computador

 

O sucesso das seguradoras sempre dependeu de sua habilidade de analisar dados e, assim, precificar e estabelecer as apólices de forma acurada. O propósito da TI tem sido dar o suporte a essas capacidades e ser considerada um custo do negócio. No ambiente digital, essa relação e essa atitude têm de mudar. Embora as seguradoras de sucesso do futuro ainda terão excelência na análise de grandes volumes de dados, suas funções de TI assumirão um papel estratégico. Nas palavra de Danny Dagher, CIO da sucursal regional do Bank Audi, “existem muitas seguradoras que operam a TI como função de suporte. No ambiente atual, essa é uma estratégia mortal.”

A razão disso é que a tecnologia está definindo o modelo de negócio vencedor em seguros, como em outras indústrias. Ela estabeleceu um nível superior para serviços – com clientes hoje esperando simplicidade, velocidade, transparência e customização – enquanto reduz o custo daquele serviço. Ao mesmo tempo, com tal volume de dados em tempo real gerado em um mundo conectado, a tecnologia digital está conduzindo as seguradoras por novos tipos de negócios que ajudam os clientes a mitigar o risco, em vez de simplesmente protegê-los contra ele.

Se a TI está no centro de um novo modelo de negócio, as seguradoras precisam assumir dois compromissos.

Primeiro, terão de investir pesadamente para construir as capacidades de TI, modernizando as suas plataformas centrais. Para alguns operadores, isso pode significar até 10% do lucro anual ao longo de cinco anos, dependendo do ponto de partida e da extensão da modernização necessária. Tal nível de gasto pode ser difícil de ser contemplado, haja vista que os prêmios estão fadados a cair como resultado da tecnologia digital. Contudo, elas deveriam ter em mente que investimentos sábios para atualizar a TI podem, por fim, diminuir os custos operacionais e de TI com relação àqueles de seus pares, trazendo eficiência em TI ao nível requerido no mercado atual.

Segundo, as seguradores terão de adotar novas formas de trabalho. Isso significa uma abordagem diferenciada no desenvolvimento da TI, e um modelo operacional de TI mais colaborativo que muda não só a forma como os líderes de negócio trabalham com ela, mas também como pensar acerca da TI. Sem essa mudança, grandes investimentos poderiam ser perdidos.

Um entendimento do que a TI precisa entregar na era digital revela o porquê de esses compromissos serem tão importantes.

Quatro elementos de um negócio digital de seguros de alto desempenho

 

Portfólio digital de produtos e serviços dentro de um ecossistema de parceiros

Produtos e serviços possíveis pela tecnologia digital evoluem constantemente. Um portfólio de ponta já inclui características como precificação dinâmica, em que os preços são ajustados constantemente com base nas previsões relacionadas a pedidos, sinistros e rotatividade de clientes, por exemplo, e customização em tempo real de produtos através de um conjunto de módulos obrigatórios e opcionais do produto, novamente permitindo a precificação dinâmica.

Novos tipos de produto emergirão à medida que a tecnologia digital altera a natureza da indústria. Acesso a dados cada vez mais reais, particularmente via IoT, significa avaliação não só mais acurada do risco, mas também um risco menor. Sensores em sua casa podem alertar de perigo de incêndio; sensores em seu carro podem ajudar a prevenir acidentes; e sensores em seu corpo podem alertar médicos de problemas de saúde. Além disso, esses dados dão origem a novos serviços que podem ser combinados com produtos das seguradoras – um checkup médico, ou uma revisão agendada automaticamente para reparos quando uma falha for detectada em um carro.

Em um mundo conectado, é fundamental que as seguradores precisarão complementar seus dados proprietários com dados de outras indústrias e fontes externas. Por exemplo, os fabricantes de automóveis seguramente terão mais insights quanto ao risco potencial do condutor que as seguradoras tão logo os sensores forem adotados como padrão. As seguradores não serão, portanto, mais capazes de confiar unicamente nas habilidades de subscrição e registros, mas precisarão estabelecer parcerias com empresas de outras indústrias, tais como os fabricantes de automóveis e os operadores de telecomunicações, de modo a fazer parte do ecossistema alimentado pelo fluxo de dados, oferecendo produtos e serviços dos quais o seguro é somente um dos componentes.

As capacidades de TI claramente contribuem para o valor de tais portfolios digitais. Tecnicamente, os sistemas de produto precisam ser flexíveis de modo a mapear estruturas modulares de produto, prestando-se à integração, junto a outros sistemas no ambiente da TI, com aqueles de parceiros externos, possibilitando o desenvolvimento, teste e lançamento conjuntos. Organizacionalmente, a TI precisa apoiar o negócio com vistas ao lançamento de novos produtos no mercado dentro de semanas em vez de meses, e com pouco ou nenhum esforço adicional dela requerido para implementá-las seja no sistema de produto, seja noutros sistemas centrais.

A TI terá de administrar vários tipos de parcerias. Sob o modelo de seguro tradicional, não havia diferenciação clara entre os clientes e os fornecedores da seguradora. Mas essa linha divisória já não está mais tão clara, à medida que as seguradores oferecem cada dia mais serviços com valor agregado que são providos/fornecidos por parceiros externos, além dos produtos de seguro convencionais, e um ecossistema de parceiros, portanto, já é realidade.

A aplicação do omnichannel na experiência do consumidor

Independentemente dos produtos e serviços oferecidos por uma seguradora, os clientes querem ter acesso a eles em diversos canais, de forma integrada, de modo a desfrutar a mesma experiência positiva a qual estão acostumados com outras indústrias, tais como o varejo. E eles querem ser capazes de trocar de canal sem ter de reinserir informação. Companhias que fracassarem em oferecer tal experiência omnichannel perderão clientes para os concorrentes que o fizerem.

As implicações para as seguradoras são incertas. Eles precisam de plataformas permanentes para todos os canais, com funcionalidades disponíveis aos clientes, vendedores, e parceiros externos em diversos dispositivos e aplicações que facilitem o processo de vendas com clientes existentes e potenciais. Além disso, precisam oferecer a esses clientes ferramentas de autoatendimento que lhes permitam obter cotações em tempo real, fazer alterações administrativas às apólices (tais como mudar um endereço ou direcionar a informação de débito em conta) ou comunicar um pedido/sinistro.

Operações automatizadas

A automação de processos aumenta a satisfação do cliente enquanto reduz custos operacionais, tocando em todos os pontos da cadeia de valor, independentemente da linha ou do canal de negócio. A geração de leads de vendas e de processamento de pedidos em alta frequência, mas com baixo custo, são só dois candidatos prontos para a automação. Cada vez mais, todavia, seguradoras precisarão não só automatizar processos básicos, mas também utilizar robótica com inteligência artificial e ferramentas avançadas de análise para tornar o processo decisório mais rápido.

Alcançar um alto nível de automação requer mudanças profundas na arquitetura de TI porque todo camada é afetada. Por exemplo, a administração de apólices e os sistemas de pedidos precisarão ser repensados, seja em resposta a uma frequência maior de operações, seja pela introdução da robótica e de sistemas de script, ou ferramentas melhoradas de fluxo de trabalho.

Ferramentas de análise avançadas

Seguradoras cada vez mais empregam ferramentas de análise avançadas para ajudá-las a tomar decisões melhores. Algumas seguradoras de automóveis, por exemplo, usam scores de crédito para avaliar o risco de forma mais precisa, já que as ferramentas de análise revelaram que as pessoas que pagam as suas contas em dia tendem a ser motoristas mais seguros. E algumas seguradoras de vida usam mídias sociais e dados geográficos para reduzir a fraude em 25%. Em última instância, as ferramentas de análise avançadas tornar-se-ão a capacidade no centro da forma como os negócios são administrados ao longo da cadeia de valor, aumentando mais ainda o nível de automação.

Capturar o potencial da tecnologia depende da habilidade de administrar e analisar dados (seja de fontes internas ou externas) de forma consistente ao longo de todos os canais. Ambas requererão mudanças significativas nas arquiteturas existentes de TI. Isso inclui o estabelecimento de um sistema máster de gestão de dados que apresente uma visão consolidada de todos os dados, em particular, dados de consumidor e produto, e utilize big data e ferramentas de análise que integram as fontes de dados e oferecem plataformas que geram insights criadores de valor via modelos preditivos e machine learning (aprendizado de máquina).

Estratégia para construir a próxima geração de TI

Entregar em todas as áreas é uma questão complexa. Existe o desafio técnico de superar a resistência do legacy system (sistema existente), e o prático de contratar novos talentos – ambos os quais podem ser de conhecimento de algumas seguradoras. Ainda assim, se a estratégia total de valor da TI quiser ser maximizada, formas novas e frequentemente não convencionais de trabalho e pensamento também serão exigidas.

Vemos quatro elementos-chave de uma estratégia para modernizar a TI para a era digital.

Construção sistemática de novas capacidades

Com a maioria das seguradoras estabelecida, existe uma lacuna entre as capacidades que elas têm e as de que precisam. Um plano claro é requerido para fechar essa lacuna, baseado no entendimento da situação atual e da situação desejada no horizonte de três a cinco anos. Áreas devem ser priorizadas e iniciativas acordadas.

Além das capacidades excepcionais gerais tais como rápido processo decisório, habilidade de aprender e reagir, e forte administração central, as qualidades essenciais necessárias para acompanhar o ritmo dos líderes digitais são: disciplina rigorosa na execução da TI, engenharia de TI com agilidade de classe mundial, infraestrutura escalável na nuvem, e arquitetura de aplicação aberta, única e flexível.

Novos talentos serão necessários para fortalecer as capacidades existentes e construir novas. Os métodos tradicionais de recrutamento via agência, ofertas de emprego ou indicações internas terão de ser complementadas com buscas nas comunidades de desenvolvedores, via participação em conferências de tecnologia e outros eventos, ou pelo estabelecimento de parcerias com fornecedores de software. Por sua vez, os desenvolvedores esperarão empregadores potenciais verificarem suas contribuições às comunidades de código aberto, não dependendo unicamente de entrevistas.

Abordagem diferenciada ao desenvolvimento da TI

Os atacantes digitais podem construir suas habilidades de TI do zero, focando precisamente em oportunidades emergentes específicas. Operadores têm a vantagem de grandes listas de segurados, mas são prejudicados por ambientes de sistema desenhados para modelos operacionais tradicionais, de difícil adaptação às preferências digitais contemporâneas. Marcus Ryu, CEO da Guidewire, um fornecedor de software para a seguradora P&C, descreve a situação como um “lock-in estratégico.”

Dito isto, esses ativos existentes ainda têm valor considerável, que precisa ser maximizado. Com frequência, a solução é uma abordagem bimodal contemplando “TI digital” e “TI fundacional”. Com respeito à primeira, as características inovadoras e os produtos demandados pelos clientes são lançados rapidamente ao substituir o desenvolvimento de software em cascata – por meio do qual o software é desenvolvido, testado e lançado em uma sequência estrita – por métodos ágeis através dos quais as equipes trabalham em sprints para alcançar metas semanais de desenvolvimento. Características/funções são testadas com clientes e refinadas e reatualizadas em iterações rápidas. Enquanto isso, o desenvolvimento e a gestão da TI fundacional – as partes que apoiam as habilidades de negócio que requerem menos agilidade e velocidade – pode ser tratadas de forma estruturada mais tradicional para assegurar a estabilidade e a confiabilidade dos sistemas, e a eficiência de custo. Nossa experiência é que a divisão entre TI digital e TI fundacional deveria ser feita de acordo com as capacidades do negócio, em que o elemento velocidade é diferencial. É por isso que portais de clientes, gerenciamento social e de relacionamento com o cliente tipicamente pertencem à TI digital, enquanto gestão de risco, gestão de fraudes, e contabilidade pertencem à TI fundacional com ciclos de lançamento mais longos.

Alguns acreditam que a abordagem bimodal tem desvantagens, argumentando que as formas ágeis de trabalho deveriam ser introduzidas do modo mais amplo possível. Nossa visão é a de que as seguradoras deveriam realmente migrar para um desenvolvimento ágil sempre que puderem, mas o fato permanece que lançamentos no domínio da TI fundacional não precisam ser tão frequentes como os no domínio da TI digital. Uma abordagem bimodal é, portanto, uma forma efetiva de assegurar que os investimentos para acelerar a entrega da TI sejam direcionados ao que agregará mais valor.

Dito isto, estabelecer uma abordagem bimodal requer tempo, consideração, e compromisso porque envolve evolução radical da TI, cultura de colaboração ágil (veja abaixo), métodos modernos de engenharia como o DevOps, uso crescente de serviços e microsserviços, melhorias na estrutura organizacional e capacitação de talentos.

Plataformas centrais modernizadas

Para muitos seguradoras, não há como escapar da necessidade de reformulação de suas plataformas centrais. Escritas usando linguagens antiquadas, normalmente orientadas para negócios (COBOL) ou PL/I, esses monolíticos sistemas de processamento em lotes normalmente não conseguem entregar a velocidade, a agilidade e a flexibilidade requeridas por um negócio digital. Eles podem apresentar dificuldades em termos de operações e escalabilidade, e são muito custosos.

Essas seguradores ficam com três escolhas: construir uma nova plataforma central de seguros por conta própria, reestruturar a existente (modernizando o código ou otimizar a arquitetura do sistema, por exemplo), ou substitui-la por um software padrão. A escolha dependerá de uma série de considerações, incluindo o estado do sistema existente, o nível de ambição e o nível de recursos. Aqueles que querem ser líderes nos processos e na inovação de produtos, e são capazes de investir de acordo, podem escolher uma plataforma proprietária. Essa foi a escolha feita por um grupo de seguros global buscando uma plataforma com um núcleo comum e customizações para o país e a entidade de modo a promover práticas comuns globalmente enquanto mantendo flexibilidade local. Seguradoras com sistemas relativamente estáveis e modernos que precisam ser capazes de suportar a tecnologia digital podem escolher a reestruturação. E os que buscam processos e produtos lean e padronizados podem considerar software-padrão a solução ideal. Um companhia de seguros de Benelux que deparou com um sistema existente muito caro inadequado para a modificação digital, e desejando instituir processos lean, escolheu o software-padrão como sua melhor opção.

Modelo operacional colaborativo de TI

O modelo operacional digital é definido por formas ágeis de trabalho e pela colaboração – internamente, em todos os setores do negócio e, externamente, com parceiros e vendedores.

Internamente, um modelo operacional digital é aquele em que a TI trabalha proximamente com todas as partes do negócio. Ainda assim, a maioria das seguradoras ainda se organiza em torno de funções como risco, subscrição, pedidos/sinistros, marketing e vendas. Embora tais funções demandem conhecimento especializado, elas são muito rígidas para responder à rápida mudança do setor. Além disso, em um setup funcional, ninguém realmente entende toda a experiência do cliente.

Equipes multifuncionais organizados em torno de produtos resolvem esse problema. Sua expertise combinada significa que são capazes de entregar produtos e serviços que os clientes querem e de acordo com a velocidade do mundo digital. Particularmente se os membros da equipe estão localizados no mesmo lugar (frequentemente, “garagens” digitais ou “fábricas”), são empoderados a tomar suas próprias decisões, e toda a equipe (não só as pessoas de TI) adotam uma abordagem rápida ao seu trabalho. Financiamento flexível – substituindo o convencional processo anual de orçamento – assegura que o investimento seja direcionado incrementalmente para os projetos que mostram mais futuro.

Externamente, a TI deve facilitar a colaboração com novos parceiros – fabricantes de automóveis, empresas de telecomunicações, fabricantes de sensores e chipsets, ou gigantes da plataforma digital como a Uber – ao permitir a integração de sistemas e processos. Ainda alguma reavaliação de relações existentes poderia também ser necessária. Se o que se deseja é o sucesso de modelos ágeis, vendedores precisam trabalham diferentemente em cooperação próxima com seguradoras. É provável que as seguradoras tenham de estabelecer um número de vendedores com os quais trabalhar. Além disso, contratos que fixam preços, escopo e salário podem precisar ser substituídos por contratos que recompensam o sucesso.

Esse tipo de modelo operacional requer mudança cultural dentro da TI e dos negócios. Líderes em ambos os campos precisam construir um entendimento dentro da organização de como a TI pode definir o valor do produto aos clientes, e como formas ágeis de trabalho podem entregar tal valor. Isso é particularmente verdade para seguro de produtos intangíveis.

Trabalhando com equipes multifuncionais ajudará a mudar o pensamento. Mas para líderes de negócios contribuírem para o ambiente colaborativo, e entender as restrições e o potencial da TI, algum treinamento formal é normalmente requerido. Um grande grupo de seguro europeu montou um programa de capacitação em TI para educar e atualizar os gestores de negócios em linha, enquanto todos os novos gestores apontados devem ter um módulo de três dias para ajudá-los a entender e capturar o valor estratégico da TI.

Construir a próxima geração de capacidades de TI não é um empreendimento fácil. O processo toca todas as dimensões da TI de uma empresa – arquitetura, panorama de aplicação, infraestrutura, processos de suporte, e modelo operacional – assim como habilidades e cultura. Enquanto os benefícios de curto prazo podem ser captados dentro de seis a 12 meses, uma atualizações geral para a próxima geração de capacidades de TI pode levar mais de cinco anos e exigir o compromisso total da empresa, bem como investimento significativo. O esforço trará uma recompensa além dos custos unitários gerais: com um setor de TI equipado para desempenhar um ter um papel estratégico crucial para o sucesso de uma seguradora no mundo digital.

Artigo traduzido a partir da publicação original: Modernizing IT for a strategic role

Autores: Krish Krishnakanthan, Jens Lansing, Markus Löffler e Björn Münstermann.

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